sábado, 17 de outubro de 2009
Curso A PESTE NEGRA
A Morte Negra de 1347-1351 ganhou um novo interesse na época atual (Naphy e Spicer, 2000; Cantor, 2001; Cohn, 2002 a e b; Wheels, 2002; de Hahn, 2002, Orent, 2004; Scott e Duncan, 2004; Cristakos et al, 2005). Compreender esta catástrofe que quase exterminou um continente é de grande importância para o mundo contemporâneo, cujas grandes epidemias ameaçam retornar sem que saibamos seus possíveis cenários num mundo atualmente globalizado e superpovoado. Talvez o agente da Grande Peste, um vírus semelhante ao Ebola, esteja dormente, esperando a oportunidade para emergir novamente, em um novo cenário ou sob uma nova forma (Scott e Duncan, 2004). Também o explosivo aumento de acessos a lugares exóticos e ambientes de alta biodiversidade, que no passado foram fonte de graves doenças, aumenta a exposição de humanos a antigos e novos agravos (Scott e Duncan, 2004). Para saber mais...
O Centro de Extensão em Microbiologia do Instituto de Microbiologia Prof. Paulo de Góes-UFRJ, informa que estão abertas as inscrições para o Curso
“A PESTE NEGRA E AS GRANDES EPIDEMIAS DA HISTÓRIA: PERSPECTIVAS PARA O 3º. MILÊNIO”
Coordenado pelo Prof. Fernando Portela Câmara-IMPPG
Data: 21 de Novembro de 2009 – Horário: 09:00 às 18:00 hs.
INFORMAÇÕES
Centro de Extensão em Microbiologia(CEM) – IMPPG/UFRJ
Tel.: 2562-6736(HORÁRIO DE ATENDIMENTO AO PÚBLICO: 10:30 às 12:30 e de 13:30 às 15:30 hs.)
E-mail: ceem@micro.ufrj.br
domingo, 20 de setembro de 2009
Esqueceram o H5N1?
O mundo esperava uma pandemia pela cepa de influenza aviária A (H5N1), mas súbita e inesperadamente emergiu uma cepa suína A (H1N1). Devemos esquecer o H5N1?
Em um trabalho publicado no Journal of Virology de 2007, um grupo da Tailândia liderado por Prasert Auewarakul, mostrou que uma cepa aviária isolada de um caso humano fatal, tinha duas substituições (posições 129 e 134) no gene da hemaglutinina, o que a tornava infecciosa tanto para aves quanto humanos.
Apesar dos vírus da influenza A terem 9 tipos de neuraminidase (N) e 16 tipos de hemaglutinina (H), somente 3 tipos de neuraminidase e 5 de hemaglutinina originaram pandemias humanas no último século: duas por H1N1, uma por H2N2 e uma por H3N2. Outras combinações foram detectadas em casos esporádicos, como resultado do contato direto entre humano/animais e humanos/aves, pelos tipos H7N7, H7N3, H9N2 e H10N3, que surgiram em infecções esporádicas e logo desapareceram.
O aparecimento da linhagem H5N1, de alto potencial pandêmico, não foi um fenômeno transiente, pois se estabeleceu endemicamente em populações de frangos e outras aves domésticas na Indonésia, Vietnam, Tailândia e, possivelmente, Egito, com casos esporádicos na Europa ocidental, principalmente em aves aquáticas migratórias. Este vírus infectou mais de 320 pessoas no mundo, tendo matado mais de 190 delas, o que justifica o temor de uma ameaça global pelo H5N1.
O virus H5N1 não se tornou pandêmico para humanos devido a um fato simples. Os virus da influenza A de aves ligam-se preferencialmente (via hemaglutinina) ao receptor de ácido siálico (AS) α2,3Gal(actose) que nas aves predomina no trato intestinal (daí porque as aves tem uma “gripe intestinal”, expelindo grandes quantidades de virus com as fezes). Estes receptores são encontrados nos humanos na parte mais inferior do trato respiratório, daí porque são difíceis de serem acessados. Deste modo, a infecção humana pelo H5N1 aviário é rara, e ainda que infectado o ser humano, será muito difícil passar a infecção para o seu semelhante. Por outro lado, os vírus de influenza A adaptados ao ser humano ligam-se preferencialmente a receptores AS α2,6Gal, que predominam no trato respiratório superior, e assim as pessoas não apenas são mais facilmente infectadas, como também transmitem facilmente a infecção. Então, para que um vírus aviário adapte-se ao ser humano bastam 2 ou 3 mutações no gene da hemaglutinina, conforme mostraram Prasert Auewarakul e seus colegas.
Enquanto nos preocupamos com a invasão do vírus suíno A (H1N1), causando a atual pandemia, o vírus aviário A (H5N1) ainda está circulando, e ele ainda pode vir a ser a próxima pandemia, se o jogo continuar.
Auewarakul P, et al. An avian influenza H5N1 virus that binds to a human-type receptor, J. Virol., 2007; 81:9950-9955.
Em um trabalho publicado no Journal of Virology de 2007, um grupo da Tailândia liderado por Prasert Auewarakul, mostrou que uma cepa aviária isolada de um caso humano fatal, tinha duas substituições (posições 129 e 134) no gene da hemaglutinina, o que a tornava infecciosa tanto para aves quanto humanos.
Apesar dos vírus da influenza A terem 9 tipos de neuraminidase (N) e 16 tipos de hemaglutinina (H), somente 3 tipos de neuraminidase e 5 de hemaglutinina originaram pandemias humanas no último século: duas por H1N1, uma por H2N2 e uma por H3N2. Outras combinações foram detectadas em casos esporádicos, como resultado do contato direto entre humano/animais e humanos/aves, pelos tipos H7N7, H7N3, H9N2 e H10N3, que surgiram em infecções esporádicas e logo desapareceram.
O aparecimento da linhagem H5N1, de alto potencial pandêmico, não foi um fenômeno transiente, pois se estabeleceu endemicamente em populações de frangos e outras aves domésticas na Indonésia, Vietnam, Tailândia e, possivelmente, Egito, com casos esporádicos na Europa ocidental, principalmente em aves aquáticas migratórias. Este vírus infectou mais de 320 pessoas no mundo, tendo matado mais de 190 delas, o que justifica o temor de uma ameaça global pelo H5N1.
O virus H5N1 não se tornou pandêmico para humanos devido a um fato simples. Os virus da influenza A de aves ligam-se preferencialmente (via hemaglutinina) ao receptor de ácido siálico (AS) α2,3Gal(actose) que nas aves predomina no trato intestinal (daí porque as aves tem uma “gripe intestinal”, expelindo grandes quantidades de virus com as fezes). Estes receptores são encontrados nos humanos na parte mais inferior do trato respiratório, daí porque são difíceis de serem acessados. Deste modo, a infecção humana pelo H5N1 aviário é rara, e ainda que infectado o ser humano, será muito difícil passar a infecção para o seu semelhante. Por outro lado, os vírus de influenza A adaptados ao ser humano ligam-se preferencialmente a receptores AS α2,6Gal, que predominam no trato respiratório superior, e assim as pessoas não apenas são mais facilmente infectadas, como também transmitem facilmente a infecção. Então, para que um vírus aviário adapte-se ao ser humano bastam 2 ou 3 mutações no gene da hemaglutinina, conforme mostraram Prasert Auewarakul e seus colegas.
Enquanto nos preocupamos com a invasão do vírus suíno A (H1N1), causando a atual pandemia, o vírus aviário A (H5N1) ainda está circulando, e ele ainda pode vir a ser a próxima pandemia, se o jogo continuar.
Auewarakul P, et al. An avian influenza H5N1 virus that binds to a human-type receptor, J. Virol., 2007; 81:9950-9955.
quinta-feira, 3 de setembro de 2009
Ro – Parâmetro Fundamental da Epidemiologia
Eis um parâmetro importante em epidemiologia que nos faz conhecer o potencial epidêmico de um vírus que se propaga em populações. Este parâmetro, chamado de número reprodutivo básico, Ro, denota a capacidade de uma pessoa infectada transmitir o vírus a outras pessoas susceptíveis com as quais entra em contato durante o seu período de transmissibilidade. Ou seja, Ro é uma estimativa teórica do que acontece quando um indivíduo infectado (a “semente infecciosa”) é colocado numa população inteiramente suscedptível.
Se Ro > 1, a transmissão aumentará e teremos uma epidemia. Se Ro < 1, a transmissão não se sustenta e a epidemia termina ou não começa. Se Ro = 1 (valor limiar), a transmissão é endêmica e em incidência muito baixa, cada caso infeccioso é substituído por um novo susceptível.
Ro varia para um mesmo patógeno, uma vez que é dependente da densidade da população exposta. Isto explica, por exemplo, porque frequentemente o Ro de uma infecção é menor em populações rurais. Também pode variar segundo o método escolhido para sua determinação.
Eis aqui alguns exemplos de Ro:
Influenza = 1,3 - 1,7
Dengue = 1,3 – 11,6
Catapora Ro = 2
Sarampo Ro = 8
Malária Ro = 50
Ascaris Ro=5
Qualquer medida de controle que objetive a erradicação de um patógeno deve procurar reduzir seu Ro abaixo do valor limiar, ou seja, Ro < 1. Isto tem importantes implicações quando devemos decidir por uma medida de controle. Entretanto, nem sempre é fácil controlar um patógeno na população. Se um agente infeccioso ou parasitário tem um Ro = 20, será de difícil controla-lo em relação à uma espécie que tem um Ro = 3. deste modo, parâmetro tem também um grande impacto na avaliação do controle de uma infecção na comunidade.
Finalmente, por que Ro chama-se número básico rerodutivo? Quando levamos em consideração uma infecção, não interessa a taxa de reproduçao do agente infeccioso, mas a capacidade de um hospedeiro infeccioso em reproduzir sua infecção na comunidade.
Se Ro > 1, a transmissão aumentará e teremos uma epidemia. Se Ro < 1, a transmissão não se sustenta e a epidemia termina ou não começa. Se Ro = 1 (valor limiar), a transmissão é endêmica e em incidência muito baixa, cada caso infeccioso é substituído por um novo susceptível.
Ro varia para um mesmo patógeno, uma vez que é dependente da densidade da população exposta. Isto explica, por exemplo, porque frequentemente o Ro de uma infecção é menor em populações rurais. Também pode variar segundo o método escolhido para sua determinação.
Eis aqui alguns exemplos de Ro:
Influenza = 1,3 - 1,7
Dengue = 1,3 – 11,6
Catapora Ro = 2
Sarampo Ro = 8
Malária Ro = 50
Ascaris Ro=5
Qualquer medida de controle que objetive a erradicação de um patógeno deve procurar reduzir seu Ro abaixo do valor limiar, ou seja, Ro < 1. Isto tem importantes implicações quando devemos decidir por uma medida de controle. Entretanto, nem sempre é fácil controlar um patógeno na população. Se um agente infeccioso ou parasitário tem um Ro = 20, será de difícil controla-lo em relação à uma espécie que tem um Ro = 3. deste modo, parâmetro tem também um grande impacto na avaliação do controle de uma infecção na comunidade.
Finalmente, por que Ro chama-se número básico rerodutivo? Quando levamos em consideração uma infecção, não interessa a taxa de reproduçao do agente infeccioso, mas a capacidade de um hospedeiro infeccioso em reproduzir sua infecção na comunidade.
Oh! – Por Que a Influenza Fere as Sensibilidades
Uma alta funcionária da OMS declarou-se supresa e maravilhada, em entrevista aos jornais, ao constatar que o vírus da influenza levava em média 6 semanas para se espalhar de um lado a outro do planeta, quando outros vírus levam mais de 6 meses (sic).
Não há necessidade da ilustre doutora ficar alarmada, pois é assim mesmo que a influenza pandêmica se propaga, incluindo as épocas em que não haviam transportes aéreos, ou ainda quando o único trnaporte eram as patas dos cavalos. E aí é que vem o “x” da questão: por que, em pandemias passadas, incluindo a de 1918-1919, a gripe se propagava com a mesma velocidade de hoje?
Digo apenas o seguintes. Trabalhamos com modelos epidemiológicos, que são apenas modelos e, como tal, úteis na medida em que nos servem de guia para explicar razoavelmente o que acontece, e a partir daí formular-mos estratégias e tomadas de decisão. Portanto, note que a afirmaçao de que o vírus da influenza se propaga com rapidez devido aos meios de transporte intercontinentais rápidos, é um argumento insustentável pela história das pandemias de gripe. Na verdade, esta aparente ou não controvérsia decorre de um fato singular: a suposição de que não existe reservatórios da influenza humana, logo a trnasmissão é rápida e sua progressão pressupõe um rápido deslocamento do hospedeiro virêmico.
Não há necessidade da ilustre doutora ficar alarmada, pois é assim mesmo que a influenza pandêmica se propaga, incluindo as épocas em que não haviam transportes aéreos, ou ainda quando o único trnaporte eram as patas dos cavalos. E aí é que vem o “x” da questão: por que, em pandemias passadas, incluindo a de 1918-1919, a gripe se propagava com a mesma velocidade de hoje?
Digo apenas o seguintes. Trabalhamos com modelos epidemiológicos, que são apenas modelos e, como tal, úteis na medida em que nos servem de guia para explicar razoavelmente o que acontece, e a partir daí formular-mos estratégias e tomadas de decisão. Portanto, note que a afirmaçao de que o vírus da influenza se propaga com rapidez devido aos meios de transporte intercontinentais rápidos, é um argumento insustentável pela história das pandemias de gripe. Na verdade, esta aparente ou não controvérsia decorre de um fato singular: a suposição de que não existe reservatórios da influenza humana, logo a trnasmissão é rápida e sua progressão pressupõe um rápido deslocamento do hospedeiro virêmico.
sexta-feira, 28 de agosto de 2009
A Ciência das Epidemias - Resumo
As doenças infecciosas são transmissíveis a partir de dois mecanismos fundamentais: 1. uma pessoa infectada pode transmitir a infecção para outra –melhor dizendo, reproduzir a infecção em ouitra – através do contato direto ou indireto; ou 2. A infecção se espalha a partir de uma fonte comum que serve de reservatório do agente infeccioso e a partir daí ele infecta pessoas que entra em contato com ele (alimentos, água). Em qualquer caso, o indivíduo infectado pode transmitir o patógeno para outros indivíduos, sendo chamado de hospedeiro amplificador, ou ele não o transmite, sendo a infecção restrita à exposição a uma fonte comum, caso em que o hospedeiro é chamado de hospedeiro terminal. Em todo caso, a infecção é sempre acidental, portanto todos os hospedeiros são acidentalmente infectados, a menos que a infecção seja intencionalmente disseminada, caso em que os hospedeiros são vítimas de um ataque biológico.
O hospedeiro amplificador é infeccioso, e a doença restringe seus movimentos diminuindo a probabilidade da transmissão. Entretanto, há casos em que o hospedeiro não desenvolve sintomatologia clínica e, assim, passa a ser um transmissor silencioso, iludindo todas as barreiras de contenção do agente sem ser detectado. Outras vezes o indivíduo recupera-se da doença mas ao invés de eliminar o patógeno do organismo passa a ser um transmissor silencioso. Estes casos caracterizam o estado portador ou o portador sadio.
A maior parte das fontes de contágio na natureza são animais hospederios, que atuam como reservatórios naturais de patógenos, sendo o homem acidentalmente infectado após exposição ao animal ou a um de seus produtos. Este tipo de infecção é conhecida como zoonoses. Há casos em que o ser humano é o único reservatório do patógeno, portanto, uma antropoose.
Para que um patógeno seja mantido numa população humana é necessário que esta tenha uma número mínimo de indivíduos, ou limiar. Por exemplo, no caso do sarampo, o número mínimo para manter o vírus na população é de 300 mil pessoas. Isto garante que o número de crianças nascidas por ano formem o corredor de susceptíveis que garante a transmissão do vírus dentro da população. Uma exceção é o vírus do herpes, cuja latência permite que ele se mantenha em populações bem menores, com cerca de mil pessoas; doenças venéreas como a gonorréia, não deixam imunidade e se mantém na população através da atividade sexual de grupos onde a troca de parceiros é frequente.
Imunidade de grupo
A maioria das infecções deixa imunidade mais ou menos duradoura. Isto explica porque uma epidemia é auto-limitada, chegando ao seu auge e então diminuindo até desaparecer ou cair em um nível endêmico. Portanto, uma epidemia confere imunidade de grupo apopulação, tornando difícil a circulação do patógeno, até que a quantidade de susceptíveis aumente o suficiente para sustentar uma outra epidemia. A imunidade de grupo pode ser aumentada e mantida vacinando-se regularmente a população, especialmente as crianças que formam o grupo de susceptíveis continuamente acrescentados após a última epidemia. Foi assim que se erradicou a varíola no mundo, e a poliomielite no Brasil. Foi assim que se erradicou a varíola no mundo, e a poliomielite no Brasil.
A imunidade de grupo contribui para diminuir a taxa de mortalidade ou sequelas devido ao nível de imunidade adquirida por infecções na infância, e que se mantém na população adulta. Para melhor compreender esse fenômeno considere os modelos Cairo e Miami da disseminação da poliomielite.
O modelo Cairo é o protótipo da transmissão de enteroviroses nos países com precárias condições de saneamento e fornecimento regular de água potável tratada. O vírus da poliomielite facilmente se dissemina entre as crianças, provocando infecções benignas na maioria, e infecções com comprometimento neurológico numa minoria, que morre ou adquire sequelas (paralisia flácida). A grande maioria das crianças fica imune (imunidade de grupo) e esta imunidade é permanente. A disseminação do vírus entre crianças contribui para uma vacinação natural, e a imunidae de grupo contribui para a reduçã da mortalidade.
O modelo Miami é o protótipo para os países desenvolvidos, com saneamento desenvolvido e água potável regular. Neste caso o vírus da poliomielite não tem condições de circular na comunidade, portanto, a proporção de susceptíveis é muito alta. Se o vírus for acidentalmente introduzido, crianças e adultos se tornarão vítimas da infecção, um grande número de pessoas terá a doença e a mortalidade e sequelas serão altas. Essas populações são as que melhor se beneficiam de um programa de vacinação.
Há infecções, contudo, em que o patógeno não circula normalmente na população, como é o caso de virus silvestres, mas que pode invadi-la acidentalmente com alta morbidade e mortalidade. Neste caso, a população é geralmente inteiramente susceptível e a morbidae e mortalidade serão altas, a menos que exista uma vacina que possa ser usada preventivamente. É o caso da febre amarela, da gripe pandêmica, e outras infecções graves com potencial de urbanização. Nestes casos, o vírus emerge de modo imprevisível e invade a população em um ataque-surpresa.
Modelos de transmissão de doenças infecciosas
A base conceitual destes modelos foi desenvolvida por Sir Ronald Ross para estudar a dinâmica de transmissão da malária, a matemática da transmissão das infecções foi desenvolvida por Kermack e McKendrick e Reed e Frost nos anos 20. Esses modelos consideram que os individuos de uma população infectada movem-se para “compartimentos” ou estágios de infecção denominados de “susceptível”, “infeccioso”, e “recuperado ou imune”. Resumidamente, este é o modelo SIR. Há também o modelo S ßà I, em que os infecciosos se recuperam como suscptiveis outra vez, como na maioria das doenças sexualmente transmissíveis; e o S à I, em que os infecciosos permanecem como tais, como é o caso das infecções por HIV e das hepatites B e C crõnicas.
Os modelos mais simples usam somente dois ou tres compartimentos, cuja passagem de um a outo é descrita por parâmetros. Assim, nos modelos simples o número de pessoas infectadas no tempo t+1 é calculado como uma função do número de pessoas infecciosas no tempo t, da taxa de contato entre um indivíduo infeccioso e susceptíveis durante a fase de contágio, da probabilidade que um infeccioso transmita o patógeno durante um contato com um susceptível no tempo t. Semelhantemente, o número de pessoas recuperadas ou imunes no tempo t+1 é calculado a partir do número de indivíduos infectantes no tempo t e duração do periodo de contágio. Deste modo, os números de pessoas susceptíveis, infectadas e recuperadas na população são calculados ao longo do tempo exibindo a dinâmica da transmissão na população, supondo uma mistura homogênea entre as pessoas. As condições assumidas no modelos não são necessariamente realísticas, pois, de fato, a taxa de contato não é constante para todas as pessoas, e não se leva em consideração as pessoas que deixam ou entram na população. Entetanto, este modelo captura o essencial da dinâmica das epidemias. Modelos mais sofisticados foram desenvolvidos para incluir a possibilidade de misturas desiguais, variação da infecciosidade, variação da susceptibilidade no tempo, e migração para dentro ou para fora da coorte. Também como os acontecimentos são dependentes, deve-se evitar que os parâmetros de transmissão sejam estáticos ou independentes uns dos outros.
Os modelos são usados para predizer o curso de uma epidemia ou para avaliar a eficiência das medidas de controle disponíveis e criar estratégias de otimização para o controle de uma epidemia. A construção de modelos úteis requer uma quantidade substancial de informação sobre os fatores que influenciam a progressão de um estágio a outro. Todos os modelos tem um objetivo comum que é o número reprodutivo efetivo de uma infecção, R, definido como o número médio de infecções produzidas a partir de um caso infeccioso. Isto contrasta com Ro, o número reprodutivo básico, que se refere a uma população completamente susceptível, enquanto R reflete o nível real de imunidade na população. Deste modo, R varia á medida que a imunidade da população se modifica com o tempo. Se susceptíveis são introduzidos na população, R aumentará, e se a proporção de susceptíveis diminui (vacinação, progressão da epidemia com consequente aumento de imunes), R diminuirá. Se R < 1, a transmissão não se sustenta, e a infecção se extinguirá com o tempo, já que cada indivíduo infectado transmitirá, em média, a infecção para menos de uma pessoa. Se R > 1, a transmissão aumenta e a epidemia se espalha até que, com o aumento da proporção de imunes, R começa a cair até atingir a condição R = 1 ou R < 1, ocasião em que a epidemia acaba. Quando R = 1, no nível mínimo, os infecciosos equilibram-se com os novos suceptíveis (nascimentos, perda de imunidade na velhice), e a infecção torna-se endêmica. A grande dificuldade em modelar o curso de uma epidemia é a variabilidade da infecciosidade entre os transmissores. Eventos raros, tais como a ocorrência de um transmissor altamente eficiente (superinfecciosos), ou a migração de um hospedeiro infeccioso para uma população não imune (viagens aéreas), podem niciar epidemias em lugares onde antes não há transmissão.
Uma vez identificado o agente de uma epidemia, a atenção volta-se para os estudos epidemiológicos procurando-se identificar os fatores de risco envolvidos na infecção, sua progressão e recuperação dos infectados. A partir daí planejam-se as intervenções que ajudem a modificar a transmissão e o curso clínico da infecção, a partir de estudos controlados e não controlados. O racional de tudo isto é a construção de modelos que permitem atingir a plena compreensão das epidemias.
Para conhecer mais sobre técnicas de investigação epidemiológica:
Câmara FP, Theophilo RLG, Santos GT, Pereira SRFG, Câmara DCP, Matos RRC. Estudo Retrospectivo (Histórico) da Dengue no Brasil: Características Regionais e Dinâmicas [Regional and Dynamics Characteristics of Dengue in Brazil – A Retrospective Study], Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical, 40(2): 192-196, 2007.
Câmara FP, Gomes AF, Santos GT, Câmara DCP. Clima e Epidemias de Dengue no Estado do Rio de Janeiro [Climate and dengue epidemics in state of Rio de Janeiro], Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical, 42(2); 137-140, 2009.
Fraser C, Donnelly CA, Cauchemez S et al. Pandemic Potential of a Strain of Influenza A (H1N1): Early Findings, Sciencexpress Report
www.sciencexpress.org/11 May 2009/Page 1/10.1126/science.1176062
O hospedeiro amplificador é infeccioso, e a doença restringe seus movimentos diminuindo a probabilidade da transmissão. Entretanto, há casos em que o hospedeiro não desenvolve sintomatologia clínica e, assim, passa a ser um transmissor silencioso, iludindo todas as barreiras de contenção do agente sem ser detectado. Outras vezes o indivíduo recupera-se da doença mas ao invés de eliminar o patógeno do organismo passa a ser um transmissor silencioso. Estes casos caracterizam o estado portador ou o portador sadio.
A maior parte das fontes de contágio na natureza são animais hospederios, que atuam como reservatórios naturais de patógenos, sendo o homem acidentalmente infectado após exposição ao animal ou a um de seus produtos. Este tipo de infecção é conhecida como zoonoses. Há casos em que o ser humano é o único reservatório do patógeno, portanto, uma antropoose.
Para que um patógeno seja mantido numa população humana é necessário que esta tenha uma número mínimo de indivíduos, ou limiar. Por exemplo, no caso do sarampo, o número mínimo para manter o vírus na população é de 300 mil pessoas. Isto garante que o número de crianças nascidas por ano formem o corredor de susceptíveis que garante a transmissão do vírus dentro da população. Uma exceção é o vírus do herpes, cuja latência permite que ele se mantenha em populações bem menores, com cerca de mil pessoas; doenças venéreas como a gonorréia, não deixam imunidade e se mantém na população através da atividade sexual de grupos onde a troca de parceiros é frequente.
Imunidade de grupo
A maioria das infecções deixa imunidade mais ou menos duradoura. Isto explica porque uma epidemia é auto-limitada, chegando ao seu auge e então diminuindo até desaparecer ou cair em um nível endêmico. Portanto, uma epidemia confere imunidade de grupo apopulação, tornando difícil a circulação do patógeno, até que a quantidade de susceptíveis aumente o suficiente para sustentar uma outra epidemia. A imunidade de grupo pode ser aumentada e mantida vacinando-se regularmente a população, especialmente as crianças que formam o grupo de susceptíveis continuamente acrescentados após a última epidemia. Foi assim que se erradicou a varíola no mundo, e a poliomielite no Brasil. Foi assim que se erradicou a varíola no mundo, e a poliomielite no Brasil.
A imunidade de grupo contribui para diminuir a taxa de mortalidade ou sequelas devido ao nível de imunidade adquirida por infecções na infância, e que se mantém na população adulta. Para melhor compreender esse fenômeno considere os modelos Cairo e Miami da disseminação da poliomielite.
O modelo Cairo é o protótipo da transmissão de enteroviroses nos países com precárias condições de saneamento e fornecimento regular de água potável tratada. O vírus da poliomielite facilmente se dissemina entre as crianças, provocando infecções benignas na maioria, e infecções com comprometimento neurológico numa minoria, que morre ou adquire sequelas (paralisia flácida). A grande maioria das crianças fica imune (imunidade de grupo) e esta imunidade é permanente. A disseminação do vírus entre crianças contribui para uma vacinação natural, e a imunidae de grupo contribui para a reduçã da mortalidade.
O modelo Miami é o protótipo para os países desenvolvidos, com saneamento desenvolvido e água potável regular. Neste caso o vírus da poliomielite não tem condições de circular na comunidade, portanto, a proporção de susceptíveis é muito alta. Se o vírus for acidentalmente introduzido, crianças e adultos se tornarão vítimas da infecção, um grande número de pessoas terá a doença e a mortalidade e sequelas serão altas. Essas populações são as que melhor se beneficiam de um programa de vacinação.
Há infecções, contudo, em que o patógeno não circula normalmente na população, como é o caso de virus silvestres, mas que pode invadi-la acidentalmente com alta morbidade e mortalidade. Neste caso, a população é geralmente inteiramente susceptível e a morbidae e mortalidade serão altas, a menos que exista uma vacina que possa ser usada preventivamente. É o caso da febre amarela, da gripe pandêmica, e outras infecções graves com potencial de urbanização. Nestes casos, o vírus emerge de modo imprevisível e invade a população em um ataque-surpresa.
Modelos de transmissão de doenças infecciosas
A base conceitual destes modelos foi desenvolvida por Sir Ronald Ross para estudar a dinâmica de transmissão da malária, a matemática da transmissão das infecções foi desenvolvida por Kermack e McKendrick e Reed e Frost nos anos 20. Esses modelos consideram que os individuos de uma população infectada movem-se para “compartimentos” ou estágios de infecção denominados de “susceptível”, “infeccioso”, e “recuperado ou imune”. Resumidamente, este é o modelo SIR. Há também o modelo S ßà I, em que os infecciosos se recuperam como suscptiveis outra vez, como na maioria das doenças sexualmente transmissíveis; e o S à I, em que os infecciosos permanecem como tais, como é o caso das infecções por HIV e das hepatites B e C crõnicas.
Os modelos mais simples usam somente dois ou tres compartimentos, cuja passagem de um a outo é descrita por parâmetros. Assim, nos modelos simples o número de pessoas infectadas no tempo t+1 é calculado como uma função do número de pessoas infecciosas no tempo t, da taxa de contato entre um indivíduo infeccioso e susceptíveis durante a fase de contágio, da probabilidade que um infeccioso transmita o patógeno durante um contato com um susceptível no tempo t. Semelhantemente, o número de pessoas recuperadas ou imunes no tempo t+1 é calculado a partir do número de indivíduos infectantes no tempo t e duração do periodo de contágio. Deste modo, os números de pessoas susceptíveis, infectadas e recuperadas na população são calculados ao longo do tempo exibindo a dinâmica da transmissão na população, supondo uma mistura homogênea entre as pessoas. As condições assumidas no modelos não são necessariamente realísticas, pois, de fato, a taxa de contato não é constante para todas as pessoas, e não se leva em consideração as pessoas que deixam ou entram na população. Entetanto, este modelo captura o essencial da dinâmica das epidemias. Modelos mais sofisticados foram desenvolvidos para incluir a possibilidade de misturas desiguais, variação da infecciosidade, variação da susceptibilidade no tempo, e migração para dentro ou para fora da coorte. Também como os acontecimentos são dependentes, deve-se evitar que os parâmetros de transmissão sejam estáticos ou independentes uns dos outros.
Os modelos são usados para predizer o curso de uma epidemia ou para avaliar a eficiência das medidas de controle disponíveis e criar estratégias de otimização para o controle de uma epidemia. A construção de modelos úteis requer uma quantidade substancial de informação sobre os fatores que influenciam a progressão de um estágio a outro. Todos os modelos tem um objetivo comum que é o número reprodutivo efetivo de uma infecção, R, definido como o número médio de infecções produzidas a partir de um caso infeccioso. Isto contrasta com Ro, o número reprodutivo básico, que se refere a uma população completamente susceptível, enquanto R reflete o nível real de imunidade na população. Deste modo, R varia á medida que a imunidade da população se modifica com o tempo. Se susceptíveis são introduzidos na população, R aumentará, e se a proporção de susceptíveis diminui (vacinação, progressão da epidemia com consequente aumento de imunes), R diminuirá. Se R < 1, a transmissão não se sustenta, e a infecção se extinguirá com o tempo, já que cada indivíduo infectado transmitirá, em média, a infecção para menos de uma pessoa. Se R > 1, a transmissão aumenta e a epidemia se espalha até que, com o aumento da proporção de imunes, R começa a cair até atingir a condição R = 1 ou R < 1, ocasião em que a epidemia acaba. Quando R = 1, no nível mínimo, os infecciosos equilibram-se com os novos suceptíveis (nascimentos, perda de imunidade na velhice), e a infecção torna-se endêmica. A grande dificuldade em modelar o curso de uma epidemia é a variabilidade da infecciosidade entre os transmissores. Eventos raros, tais como a ocorrência de um transmissor altamente eficiente (superinfecciosos), ou a migração de um hospedeiro infeccioso para uma população não imune (viagens aéreas), podem niciar epidemias em lugares onde antes não há transmissão.
Uma vez identificado o agente de uma epidemia, a atenção volta-se para os estudos epidemiológicos procurando-se identificar os fatores de risco envolvidos na infecção, sua progressão e recuperação dos infectados. A partir daí planejam-se as intervenções que ajudem a modificar a transmissão e o curso clínico da infecção, a partir de estudos controlados e não controlados. O racional de tudo isto é a construção de modelos que permitem atingir a plena compreensão das epidemias.
Para conhecer mais sobre técnicas de investigação epidemiológica:
Câmara FP, Theophilo RLG, Santos GT, Pereira SRFG, Câmara DCP, Matos RRC. Estudo Retrospectivo (Histórico) da Dengue no Brasil: Características Regionais e Dinâmicas [Regional and Dynamics Characteristics of Dengue in Brazil – A Retrospective Study], Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical, 40(2): 192-196, 2007.
Câmara FP, Gomes AF, Santos GT, Câmara DCP. Clima e Epidemias de Dengue no Estado do Rio de Janeiro [Climate and dengue epidemics in state of Rio de Janeiro], Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical, 42(2); 137-140, 2009.
Fraser C, Donnelly CA, Cauchemez S et al. Pandemic Potential of a Strain of Influenza A (H1N1): Early Findings, Sciencexpress Report
www.sciencexpress.org/11 May 2009/Page 1/10.1126/science.1176062
domingo, 23 de agosto de 2009
As três “leis” da dinâmica de populações
(se utilizar partes do texto, cite a fonte: Portela Câmara, F. As três “leis” da dinâmica de populações, in www.popdinâmica.blogspot.com)
O princípio da dinâmica de populações começa pela função R, que define a taxa de crescimento individual. Isto também é importante para conhecer as implicações do numero reprodutivo básico em epidemiologia.
1
Uma característica, que pode ser considerada uma lei da ecologia de populações, é que as espécies formam população porque seu crescimento é uma função exponencial positiva. Em outras palavras, uma população tende a crescer geometricamente e na for afetada ou limitada por algum fator ambiental. Como Malthus foi o primeiro a descrever este princípio, esta lei algumas vezes é chamada de “primeira lei de Malthus”. Representamos este princípio como a derivada::
d(lnN)/dt = R = constante
(N = tamanho da população; R = taxa de crescimento logarítmico per capita instantâneo)
Esta lei pode ser enunciada da seguinte forma: “toda população cresce a uma taxa logarítmica constante a menos que seja afetada por forças ambientais”. Daí porque essa lei também é denominada de “lei do crescimento uniforme”.
Está claro que toda a dinâmica de uma população está relacionada ao desvio de R do movimento uniforme esperado. Definimos agora uma função R:
R = f(B,G,P)
(B = fatores bióticos, ou outras populações; G = fatores genéticos; P = fatores abióticos)
Da mesma forma que a densidade de população, N, depende de R, esta função também é sensível aos valores presentes ou passados de N. Ou seja:
R = f(Nt-d)
Sendo d um retardo da resposta de R em relação a uma mudança de N. este retardo na resposta, de variada magnitude, origina feedback no sistema, podendo levar a um comportamento oscilatório ou mesmo caótico.
2
No mundo real, o crescimento acaba sendo limitado por forças ambientais, tais como restrição de espaço e alimentos, levando a “competição intra-específica” em que os indivíduos da espécie competem entre si pelos mesmos recursos. Deste modo, a densidade populacional aproxima-se assintoticamente de um valor de equilíbrio, a “capacidade de carga”, um ponto fixo atrator. R diminui gradualmente até o valor 0. A densidade de equilíbrio é o momento em que a natalidade e mortalidade se igualam. A população é regulada neste ponto por feedback negativo: se ultrapassa o valor de equilíbrio, a mortalidade aumenta até restituir o equilíbrio; se diminui, a natalidade aumenta em direção ao equilíbrio. A função R é descrita como:
R = A(1 – N/K)
Sendo A o valor máximo de R (quando N << K), N a densidade da população e K a capacidade de carga ou densidade de equilíbrio (valor máximo de N ns condições ambientais vigentes).
Esta seria a “segunda lei de Malthus” ou “princípio de Verhulst”. A função é generalizada na expressão:
R = A[1 – (Nt-d/K)^Q]
(Q é um coeficiente que caracteriza um efeito não-linear na densidade, o que freqüentemente se observa na natureza)
3
Quando duas ou mais populações interagem temos uma competição inter-específica, sendo o caso mais estudado e geral a interação predador-presa. Esta interação gera feedback negativo entre uma espécie e a outra, no sentido em que o aumento n número de presas resulta no aumento da população do predador (supondo que as presas sejam o seu único recurso), isto retroage negativamente sobre as presas, fazendo-as diminuir, e assim também a população de predadores. A rarefação das presas reduz consideravelmente os ataques sobre elas e então começam a crescer, trazendo a população de predadores com ela. As funções R para predadores (P) e presas (N) são, então:
RN = fN(Nt-1, Pt-1)
RP = fP(Pt-1, Nt-1)
(RN e RP são as taxas de variação per capita de presas e predadores, respectivamente; fN e fP são as funções não específicas de densidades; e Nt-1 e Pt-1 as condições iniciais. Estes sistemas de equações de primeira ordem podem ser reduzidos para uma equação de segunda ordem para uma das espécies, por exemplo, para o sistema acima, a equação poderia ser reduzidas para as presas, e teríamos:.
R = f(Nt-1, Nt-2)
Mostrando que elas estão sujeitas a dois retardos de tempo, portanto, a um feedback de primeira ordem e outro de segunda ordem. No caso mais geral:
R = f(Nt-1, Nt-2, …, Nt-d)
Assumindo agora que f( ) pode ser aproximado para uma função linear, obtemos a função polinomial explícita:
R = a0 + a1Nt-1 + a2Nt-2 + … + adNt-d
Frequentemente usado em análises de séries temporais em ecologia. As densidades no lado direito da equação devem ser transformadas em logaritmos quando vamos proceder uma análise estatística.
As interações entre populações e fatores ambientais podem levar a retardos nos feedbacks entre elas, e a Teoria Geral dos Sistemas ensina que retardos temporais levam a oscilações instáveis nas alças de feedbacks. Isto leva à proposição de que dinâmicas cíclicas (oscilatórias) ocorrerão muito provavelmente quando populações interagem
O princípio da dinâmica de populações começa pela função R, que define a taxa de crescimento individual. Isto também é importante para conhecer as implicações do numero reprodutivo básico em epidemiologia.
1
Uma característica, que pode ser considerada uma lei da ecologia de populações, é que as espécies formam população porque seu crescimento é uma função exponencial positiva. Em outras palavras, uma população tende a crescer geometricamente e na for afetada ou limitada por algum fator ambiental. Como Malthus foi o primeiro a descrever este princípio, esta lei algumas vezes é chamada de “primeira lei de Malthus”. Representamos este princípio como a derivada::
d(lnN)/dt = R = constante
(N = tamanho da população; R = taxa de crescimento logarítmico per capita instantâneo)
Esta lei pode ser enunciada da seguinte forma: “toda população cresce a uma taxa logarítmica constante a menos que seja afetada por forças ambientais”. Daí porque essa lei também é denominada de “lei do crescimento uniforme”.
Está claro que toda a dinâmica de uma população está relacionada ao desvio de R do movimento uniforme esperado. Definimos agora uma função R:
R = f(B,G,P)
(B = fatores bióticos, ou outras populações; G = fatores genéticos; P = fatores abióticos)
Da mesma forma que a densidade de população, N, depende de R, esta função também é sensível aos valores presentes ou passados de N. Ou seja:
R = f(Nt-d)
Sendo d um retardo da resposta de R em relação a uma mudança de N. este retardo na resposta, de variada magnitude, origina feedback no sistema, podendo levar a um comportamento oscilatório ou mesmo caótico.
2
No mundo real, o crescimento acaba sendo limitado por forças ambientais, tais como restrição de espaço e alimentos, levando a “competição intra-específica” em que os indivíduos da espécie competem entre si pelos mesmos recursos. Deste modo, a densidade populacional aproxima-se assintoticamente de um valor de equilíbrio, a “capacidade de carga”, um ponto fixo atrator. R diminui gradualmente até o valor 0. A densidade de equilíbrio é o momento em que a natalidade e mortalidade se igualam. A população é regulada neste ponto por feedback negativo: se ultrapassa o valor de equilíbrio, a mortalidade aumenta até restituir o equilíbrio; se diminui, a natalidade aumenta em direção ao equilíbrio. A função R é descrita como:
R = A(1 – N/K)
Sendo A o valor máximo de R (quando N << K), N a densidade da população e K a capacidade de carga ou densidade de equilíbrio (valor máximo de N ns condições ambientais vigentes).
Esta seria a “segunda lei de Malthus” ou “princípio de Verhulst”. A função é generalizada na expressão:
R = A[1 – (Nt-d/K)^Q]
(Q é um coeficiente que caracteriza um efeito não-linear na densidade, o que freqüentemente se observa na natureza)
3
Quando duas ou mais populações interagem temos uma competição inter-específica, sendo o caso mais estudado e geral a interação predador-presa. Esta interação gera feedback negativo entre uma espécie e a outra, no sentido em que o aumento n número de presas resulta no aumento da população do predador (supondo que as presas sejam o seu único recurso), isto retroage negativamente sobre as presas, fazendo-as diminuir, e assim também a população de predadores. A rarefação das presas reduz consideravelmente os ataques sobre elas e então começam a crescer, trazendo a população de predadores com ela. As funções R para predadores (P) e presas (N) são, então:
RN = fN(Nt-1, Pt-1)
RP = fP(Pt-1, Nt-1)
(RN e RP são as taxas de variação per capita de presas e predadores, respectivamente; fN e fP são as funções não específicas de densidades; e Nt-1 e Pt-1 as condições iniciais. Estes sistemas de equações de primeira ordem podem ser reduzidos para uma equação de segunda ordem para uma das espécies, por exemplo, para o sistema acima, a equação poderia ser reduzidas para as presas, e teríamos:.
R = f(Nt-1, Nt-2)
Mostrando que elas estão sujeitas a dois retardos de tempo, portanto, a um feedback de primeira ordem e outro de segunda ordem. No caso mais geral:
R = f(Nt-1, Nt-2, …, Nt-d)
Assumindo agora que f( ) pode ser aproximado para uma função linear, obtemos a função polinomial explícita:
R = a0 + a1Nt-1 + a2Nt-2 + … + adNt-d
Frequentemente usado em análises de séries temporais em ecologia. As densidades no lado direito da equação devem ser transformadas em logaritmos quando vamos proceder uma análise estatística.
As interações entre populações e fatores ambientais podem levar a retardos nos feedbacks entre elas, e a Teoria Geral dos Sistemas ensina que retardos temporais levam a oscilações instáveis nas alças de feedbacks. Isto leva à proposição de que dinâmicas cíclicas (oscilatórias) ocorrerão muito provavelmente quando populações interagem
Super-infecciosos - Hubs epidêmicos nas redes sociais
Em uma epidemia, nem sempre a capacidade infectante é homogênea. Algumas pessoas têm a capacidade de transmitir a infecção com grande eficiência, ou seja, com um Ro maior que a média. No caso do HIV, os transmissores mais eficientes são aqueles que mantêm um maior número de relações sexuais numa população, formando os chamados “grupos de risco”. Outros casos estão ligados a características do hospedeiro ou hábitos, ou a virulência do patógeno (como na gripe atual, 2009). Estes transmissores são os que contribuem com a parcela significativa do espalhamento do patógeno numa população, mesmo quando o Ro médio é < 1. São chamados, por isso, de super-infectantes ou super-disseminadores.
Um exemplo bem estudado foi a transmissão da virose emergente que ficou conhecida como “pneumonia asiática” ou, oficialmente, SARS (sigla para “severe acute respiratory syndrome”, ou “síndrome agudo respiratório grave”), um coronavírus que surgiu no sul da China em 2002 e logo se espalhou rapidamente para outras regiões. A OMS considerou este rápido espalhamento como sendo devido a casos “superinfecciosos”, que infectam um número anormalmente grande de susceptíveis (no caso da SARS, há relato de um doente infectar até 40 pessoas). Tais casos deviam-se à uma carga viral muito alta ou a uma versão genética de um potente agente infeccioso.
O primeiro caso de SARS teria surgido em Foshan, China, em 16 de novembro de 2001. Um homem doente infectou quatro outros, mas não as quatro crianças que vivam com ele, o que torna esta doença ainda mais misteriosa. Em Janeiro do ano seguinte (2002), a doença foi levada para Guangzhou, também na China, por um vendedor de camarão, e a partir daí espalhou-se para três hospitais da cidade, um deles sendo o hospital em que o professor Liu Jianlun, um experiente pneumologista, tratou algumas das 90 vitimas. Em fevereiro, o professor Liu viajou de ônibus para um casamento em Hong Kong e hospedou-se no Metropole Hotel, em Kowloon. Ai ele ficou doente e não compareceu ao casamento.
Percebendo que podia ter contraído a SARS, ele se dirigiu ao hospital local e alertou o corpo médico sobre a epidemia de Guangdong, porém, como o governo chinês não havia declarado publicamente a epidemia, o professor Liu foi ignorado. Ele era um super-infectante, que transmitiu a SARS para sete hospedes (portanto, um Ro = 7) no 9o andar do hotel onde se hospedou (provavelmente por secreção deixada no botão do elevador), antes de se internar num hospital em Hong Kong, onde também infectou vários membros do corpo médico.
As sete pessoas infectadas no hotel foram as seguintes:
- Uma mulher de 26 anos, de Singapura, em férias em Hong Kong com uma amiga. Ao retornar ao lar, infectou 20 pessoas em cinco dias.
- Uma sino-americana de 78 anos, que levou a doença para Toronto, Canadá e a transmitiu para cinco membros de sua família antes de falecer. Este foi o único surto da doença for a do Oriente.
- Um homem de negócios sino-americano. Ele foi para Hanói, Vietnam, onde infectou 50 pessoas antes de morrer, muitas delas membros do corpo médico do hospital que o tratou (uma delas foi o médico Carlo Urbani, da OMS, que veio a falecer da doença).
- Um funcionário de aeroporto, de 26 anos, que foi internado no hospital Prince of Wales Hospital em Hong Kong, onde passou o vírus para dúzias de pessoas do corpo médico.
Após o espalhamento inicial da doença, vários outros super-infectantes ajudaram a disseminar a SARS. Houve duas pessoas infectadas em Singapura, uma delas a enfermeira que cuidou da mulher que esteve no Hotel em que se hospedou o professor Liu, em Hong Kong.
Em Hong Kong, pelo menos um super-infectante foi responsável pela epidemia em Amoy Gardens, onde mais de 100 pessoas foram infectadas em um único prédio. Outras pessoas que tiveram SARS eram muito pouco infectantes, por exemplo, a amiga que acompanhou a mulher que adoeceu em Hong Kong. Ela também teve a doença mas não infectou ninguém no hospital de Singapura.
Parece que somente uma minoria de doentes era superinfectante, e não é impossível que a doença perca sua força ao passar de pessoa a pessoa. Seja qual for a razão, a SARS acabou tornando-se controlada.
Ao todo foram contados 2.400 casos em todo mundo (China, Hong Kong, Canadá, Rússia) com 82 mortes, a maioria de profissionais da área médica que lidaram com doentes de SARS. Tal mortalidade é menor que a observada na pneumonia pneumocócica. Deste modo, houve mais pânico que perigo real.
A OMS atribuiu a SARS a um coronavírus com “99% de certeza”, porém, cientistas chineses atribuíram sua etiologia à uma clamídia, causa comum de pneumonia atípica.
O mais famoso superinfectante
Gaetan Dugas, um comissário de bordo franco canadense é conhecido como o paciente-zero da aids. Isto porque ele foi não somente o primeiro paciente diagnosticado como também porque das 248 pessoas diagnosticadas com aids em abril de 1982, 40 tinham tido relação sexual com ele ou com algum parceiro dele. Dugas foi o centro de uma complexa rede sexual emergente entre homossexuais masculinos. Esta rede estava ancorada entre as costas leste e oeste do EUA, abarcando São Francisco, Nova York, Flórida e Los Angeles. Ele tinha em média 250 parceiros diferentes por ano, numa vida promiscua em clubes gay e saunas, e em uma década contaminou cerca de 2.500 pessoas diferentes. Nunca ficou claro se ele introduziu a aids nos EUA, pois, visitava frequentemente a França, país onde os primeiros casos haviam sido detectados. De qualquer forma, a partir de Dugas, cerca de 20 mil mortes por aids puderam ser ligadas direta e indiretamente.
Dugas foi o centro de uma epidemia obscura que começou com poucos casos e em poucos anos havia se tornado uma crise nacional. Os modelos epidemiológicos clássicos falharam em detectar e controlar a epidemia que avançava, porque sua transmissão seguia um modelo de redes, com um elemento altamente conectado – um superinfectante – movimentando-se pela rede social na qual era uma espécie de hub.
Essa observação leva a um paradigma atual muito importante...
Copyright/2009
(Esse assunto é parte de um capítulo de livro a ser publcado em breve)
Um exemplo bem estudado foi a transmissão da virose emergente que ficou conhecida como “pneumonia asiática” ou, oficialmente, SARS (sigla para “severe acute respiratory syndrome”, ou “síndrome agudo respiratório grave”), um coronavírus que surgiu no sul da China em 2002 e logo se espalhou rapidamente para outras regiões. A OMS considerou este rápido espalhamento como sendo devido a casos “superinfecciosos”, que infectam um número anormalmente grande de susceptíveis (no caso da SARS, há relato de um doente infectar até 40 pessoas). Tais casos deviam-se à uma carga viral muito alta ou a uma versão genética de um potente agente infeccioso.
O primeiro caso de SARS teria surgido em Foshan, China, em 16 de novembro de 2001. Um homem doente infectou quatro outros, mas não as quatro crianças que vivam com ele, o que torna esta doença ainda mais misteriosa. Em Janeiro do ano seguinte (2002), a doença foi levada para Guangzhou, também na China, por um vendedor de camarão, e a partir daí espalhou-se para três hospitais da cidade, um deles sendo o hospital em que o professor Liu Jianlun, um experiente pneumologista, tratou algumas das 90 vitimas. Em fevereiro, o professor Liu viajou de ônibus para um casamento em Hong Kong e hospedou-se no Metropole Hotel, em Kowloon. Ai ele ficou doente e não compareceu ao casamento.
Percebendo que podia ter contraído a SARS, ele se dirigiu ao hospital local e alertou o corpo médico sobre a epidemia de Guangdong, porém, como o governo chinês não havia declarado publicamente a epidemia, o professor Liu foi ignorado. Ele era um super-infectante, que transmitiu a SARS para sete hospedes (portanto, um Ro = 7) no 9o andar do hotel onde se hospedou (provavelmente por secreção deixada no botão do elevador), antes de se internar num hospital em Hong Kong, onde também infectou vários membros do corpo médico.
As sete pessoas infectadas no hotel foram as seguintes:
- Uma mulher de 26 anos, de Singapura, em férias em Hong Kong com uma amiga. Ao retornar ao lar, infectou 20 pessoas em cinco dias.
- Uma sino-americana de 78 anos, que levou a doença para Toronto, Canadá e a transmitiu para cinco membros de sua família antes de falecer. Este foi o único surto da doença for a do Oriente.
- Um homem de negócios sino-americano. Ele foi para Hanói, Vietnam, onde infectou 50 pessoas antes de morrer, muitas delas membros do corpo médico do hospital que o tratou (uma delas foi o médico Carlo Urbani, da OMS, que veio a falecer da doença).
- Um funcionário de aeroporto, de 26 anos, que foi internado no hospital Prince of Wales Hospital em Hong Kong, onde passou o vírus para dúzias de pessoas do corpo médico.
Após o espalhamento inicial da doença, vários outros super-infectantes ajudaram a disseminar a SARS. Houve duas pessoas infectadas em Singapura, uma delas a enfermeira que cuidou da mulher que esteve no Hotel em que se hospedou o professor Liu, em Hong Kong.
Em Hong Kong, pelo menos um super-infectante foi responsável pela epidemia em Amoy Gardens, onde mais de 100 pessoas foram infectadas em um único prédio. Outras pessoas que tiveram SARS eram muito pouco infectantes, por exemplo, a amiga que acompanhou a mulher que adoeceu em Hong Kong. Ela também teve a doença mas não infectou ninguém no hospital de Singapura.
Parece que somente uma minoria de doentes era superinfectante, e não é impossível que a doença perca sua força ao passar de pessoa a pessoa. Seja qual for a razão, a SARS acabou tornando-se controlada.
Ao todo foram contados 2.400 casos em todo mundo (China, Hong Kong, Canadá, Rússia) com 82 mortes, a maioria de profissionais da área médica que lidaram com doentes de SARS. Tal mortalidade é menor que a observada na pneumonia pneumocócica. Deste modo, houve mais pânico que perigo real.
A OMS atribuiu a SARS a um coronavírus com “99% de certeza”, porém, cientistas chineses atribuíram sua etiologia à uma clamídia, causa comum de pneumonia atípica.
O mais famoso superinfectante
Gaetan Dugas, um comissário de bordo franco canadense é conhecido como o paciente-zero da aids. Isto porque ele foi não somente o primeiro paciente diagnosticado como também porque das 248 pessoas diagnosticadas com aids em abril de 1982, 40 tinham tido relação sexual com ele ou com algum parceiro dele. Dugas foi o centro de uma complexa rede sexual emergente entre homossexuais masculinos. Esta rede estava ancorada entre as costas leste e oeste do EUA, abarcando São Francisco, Nova York, Flórida e Los Angeles. Ele tinha em média 250 parceiros diferentes por ano, numa vida promiscua em clubes gay e saunas, e em uma década contaminou cerca de 2.500 pessoas diferentes. Nunca ficou claro se ele introduziu a aids nos EUA, pois, visitava frequentemente a França, país onde os primeiros casos haviam sido detectados. De qualquer forma, a partir de Dugas, cerca de 20 mil mortes por aids puderam ser ligadas direta e indiretamente.
Dugas foi o centro de uma epidemia obscura que começou com poucos casos e em poucos anos havia se tornado uma crise nacional. Os modelos epidemiológicos clássicos falharam em detectar e controlar a epidemia que avançava, porque sua transmissão seguia um modelo de redes, com um elemento altamente conectado – um superinfectante – movimentando-se pela rede social na qual era uma espécie de hub.
Essa observação leva a um paradigma atual muito importante...
Copyright/2009
(Esse assunto é parte de um capítulo de livro a ser publcado em breve)
sábado, 22 de agosto de 2009
A H1N1 - Interlúdio Clínico, Patobiológico e Epidemiológico
O vírus da influenza tem oito genes distribuídos, respectivamente, em oito segmentos de RNA fita simples de polaridade negativa. Os genes/segmentos são PB1, PB2 e PA, genes que formam a polimerase viral; NP, gene da nucleoproteína; M, gene da proteína da matriz; NA, gene da neuraminidase; HA, gene da hemaglutinina; e NS, gene da proteína não estrutural.
A infecção pelo vírus da influenza requer a ligação entre sua hemaglutinina e receptores celulares contendo acido siálico. O qual existe sob duas formas: alfa-2,3 e alfa-2,6. As linhagens de aves ligam-se preferencialmente aos receptores alfa-2,3, que localizam-se no trato intestinal; enquanto as linhagens humanas preferem o alfa-2,6 que existem no trato respiratório. Esta mudança requer uma simples substituição de aminoácidos. O presente vírus A H1N1 (suíno, suposto...) tem grande especificidade para os receptores pulmonares e apresenta também para receptores presentes no trato intestinal humano. Daí porque uma quantidade bem maior de gripes que cursam com diarréia aguda com ou sem vômitos está sendo observada. Febre também não é um sintoma importante. No México, menos de um terço dos casos cursava com febre, e na Argentina, menos de metade ds casos].
A alta patogenicidade das linhagens H5N1 aviária em humanos, bem com da linhagem A H1N1 de 1918, deve-se a um gene PB1-F2 que é lido por deslocamento de pauta de leitura dentro do gene PB1, que codifica uma subunidade da polimerase viral. Este gene está associado a alta patogenicidade da influenza, levando ao aumento da carga viral nos pulmões e a letal tempestade de citocinas. O produto do gene PB1-F2 é uma proteína de 90 aminoácidos. Sua atividade:
1. permeabiliza as mitocônrias fazendo vazar o citocromo c para o exterior;
2. induz apoptose nos linfócitos T CD8 e nos macrófagos alveolares;
3. aumenta a gravidade da infecção pelo vírus da influenza e favorece as infecções secundárias;
4. como resultado temos uma extensa necrose bronquio-alveolar, abudante infiltrado inflamatório no pulmão, levando a insuficiencia respiratória aguda, produzidos pela "tempestade de citocinas" consequente a ação viral.
Este gene está truncado na presente linhagem pandêmica A H1N1 2009, tal que a proteína PB1-F2 não é produzida. Portanto, espera-se que a mortalidade desta cepa seja menor que a H1N1 1918.
Agora que a estação fria está terminando, não é razão ainda para se comemorar o fim da gripe. Começa o inverno no hemisfério norte e o vírus ainda está evoluindo, apresentando mutações frequentes. Talvez ganhe força e retorne com mais força, ou comece a declinar. É cedo ainda para se definir um curso. Também não há motivo para relaxar a guarda por aqui. A experiência mostrou que os casos tendem para um pico em 4 semanas e depois caem... para retornar com força daí a algumas semanas. Sejamos prudentes e vamos manter as medidas de higiene preventiva.
A infecção pelo vírus da influenza requer a ligação entre sua hemaglutinina e receptores celulares contendo acido siálico. O qual existe sob duas formas: alfa-2,3 e alfa-2,6. As linhagens de aves ligam-se preferencialmente aos receptores alfa-2,3, que localizam-se no trato intestinal; enquanto as linhagens humanas preferem o alfa-2,6 que existem no trato respiratório. Esta mudança requer uma simples substituição de aminoácidos. O presente vírus A H1N1 (suíno, suposto...) tem grande especificidade para os receptores pulmonares e apresenta também para receptores presentes no trato intestinal humano. Daí porque uma quantidade bem maior de gripes que cursam com diarréia aguda com ou sem vômitos está sendo observada. Febre também não é um sintoma importante. No México, menos de um terço dos casos cursava com febre, e na Argentina, menos de metade ds casos].
A alta patogenicidade das linhagens H5N1 aviária em humanos, bem com da linhagem A H1N1 de 1918, deve-se a um gene PB1-F2 que é lido por deslocamento de pauta de leitura dentro do gene PB1, que codifica uma subunidade da polimerase viral. Este gene está associado a alta patogenicidade da influenza, levando ao aumento da carga viral nos pulmões e a letal tempestade de citocinas. O produto do gene PB1-F2 é uma proteína de 90 aminoácidos. Sua atividade:
1. permeabiliza as mitocônrias fazendo vazar o citocromo c para o exterior;
2. induz apoptose nos linfócitos T CD8 e nos macrófagos alveolares;
3. aumenta a gravidade da infecção pelo vírus da influenza e favorece as infecções secundárias;
4. como resultado temos uma extensa necrose bronquio-alveolar, abudante infiltrado inflamatório no pulmão, levando a insuficiencia respiratória aguda, produzidos pela "tempestade de citocinas" consequente a ação viral.
Este gene está truncado na presente linhagem pandêmica A H1N1 2009, tal que a proteína PB1-F2 não é produzida. Portanto, espera-se que a mortalidade desta cepa seja menor que a H1N1 1918.
Agora que a estação fria está terminando, não é razão ainda para se comemorar o fim da gripe. Começa o inverno no hemisfério norte e o vírus ainda está evoluindo, apresentando mutações frequentes. Talvez ganhe força e retorne com mais força, ou comece a declinar. É cedo ainda para se definir um curso. Também não há motivo para relaxar a guarda por aqui. A experiência mostrou que os casos tendem para um pico em 4 semanas e depois caem... para retornar com força daí a algumas semanas. Sejamos prudentes e vamos manter as medidas de higiene preventiva.
A H1N1 e Tamiflu - Evolução e Populações Virais
A nova linhagem de influeza A H1N1, suína (suposto) é uma reassociação genômica que resultou em antígenos H e N novos, portanto, uma cepa pandêmica. Causa mortalidade em adultos jovens saudáveis, o que não é típico das gripes sazonais, além dos imunodeficientes novos ou velhos, com especial seletividade para as grávidas. O vírus por enquanto é sensível ao Tamiflu, um inibidor da neuraminidase viral, antígeno essencial para a entrada do vírus na célula hospedeira. Deste modo, o Tamiflu é um quimioprofilático, protegendo o hospedeiro da gripe em seu início e os que foram expostos ao vírus por proximidade com o caso suspeito. Reduzindo a carga viral, o Tamiflu oferece ao organismo oportunidade de debelar com maior facilidade o vírus, sem impedir que o doente adquira imunidade para o mesmo. Usado tardiamente, o Tamiflu, apesar de conter a carga viral, não interfere nos efeitos patológicos da pneumonia por influenza, e nem em seu curso letal. O Tamiflu deve ser usado precocemente, desde que a presença da nova cepa pandêmica seja detectada, não importando sua proporção em relação a cepa sazonal, a qual mais tarde será inevitavelmente substituída (ver mais abaixo). O Tamiflu é profilático, portanto, não apenas dirigido ao paciente como também aos expostos, como o médico assistente e demais profissionais de saúde, e familiares, além dos grupos de risco já sabidos.
O governo brasileiro monopolizou a distribuição do Tamiflu, condicionando-a a uma desnecessária burocracia para retirar o medicamento dos postos de distribuição, limitando o cidadão na liberdade de escolha e o médico, da relação direta com o paciente mediante uma simples prescrição, sem burocracia intermediadora e protocolos que engessam uma decisão médica e a submete a critérios leigos. O Ministério da Saúde, contudo, em seu protocolo para orientação no tratamento da gripe, publicado em 04/08/2009 no site
http://portal.saude.gov.br/portal/aplicacoes/noticias/default.cfm?pg=dspDetalheNoticia&id_area=124&CO_NOTICIA=10460
justifica esta medida no item 6 dizendo: " 6) O Ministério da Saúde reitera que o uso indiscriminado do remédio pode tornar o vírus mais resistente e abrir caminho para o surgimento de novas cepas, o que traria mais riscos à saúde pública, como vem alertando a Organização Mundial da Saúde."
Ora, temos aqui um problema de dinâmica de populações, uma vez que uma epidemia nada mais é que um desenvolvimento do modelo predador-presa.
Em ecologia moderna, toda dinâmica de populações está ligada à genética de populações, portanto, essa dinâmica é também evolucionária. Define-se hoje evolução como mudança na frequência de genes ao longo das gerações, sendo importante notar que esta mudança não está necessariamente condicionada a seleção natural, como geralmente se pensa, e pode decorrer de outros processos. Como Darwin não conhecia ainda os genes, a seleção natural do melhor adaptado era a única força evolutiva aceitável. O Tamiflu pode selecionar cepas resistentes a este medicamento, mas dizer que isto leva a um cepa mais virulenta é desconhecer totalmente a teoria da evolução, a genética de populações e a genômica viral. Além disso, dinamicamente o uso precoce do Tamiflu pode ser benéfico, reduzindo significativamente a mortalidade sem afetar a aquisição de imunidade de grupo. Vejamos.
A presente pandemia é uma típica "epidemia de população virgem" (entenda-se: população sem nenhuma defesa imunológica prévia para o novo vírus). Na fase inicial, o vírus evolui selecionando-se formas mais adaptadas e de crescimento rápido (estratégia r), espalhando-se rapidamente na população numa primeira onda invasora. Esta seleção de replicantes rápidos está associada a um aumento na virulência à medida que a propagação aumenta. Com isso, cepas mais virulentas são selecionadas e o patógeno garante a transmissão de seus genes. Ao mesmo tempo, a população experimenta mortalidade acima do esperado, sem que isto afete o aumento da proporção de imunes (recuperados da infecção). Esse último fenômeno é conhecido como "imunidade de grupo", e seu aumento reduz a transmissão viral, difcultando-a até extingui-la (após mais duas ou três ondas sazonais, no caso de uma nova linhagem de influenza A).
Quando a população torna-se em sua maior parte imune, cepas mais atenuadas do vírus começam a ser selecionadas. Estas cepas levam mais tempo no hospedeiro (o que aumenta a chance de transmissão na população agora escassa de susceptíveis), persistindo agora nas crianças nascidas depois da pandemia (totalmente susceptíveis) e nos idosos imunologicamente deficitários, caso a proporção destes seja suficiente para sustentar a transmissão (o que exige uma população suficientemente grande). Nesta fase, a seleção muda para a estratégia K. É deste modo que uma cepa pandêmica atenua-se e persiste como cepa "sazonal". Ocasionalmente, os virus da influenza sofrem mutações que origina variantes capazes de iludir o sistema imune das pessoas anteriormente imunizadas pelo virus pandêmico. Isto dá origem a epidemias sazonais de baixa mortalidade.
Na fase inicial da epidemia, a seleção de cepas mais virulentas é uma tendência proporcionada pelo tamanho da população e sua alta proporção de susceptíveis. O Tamiflu nada tem a ver com isso, como é sugerido no site do MS.
Mais cedo ou mais tarde, aparecerão cepas resistentes ao Tamiflu, mesmo que este quimioprofilático não tenha sido usado na população hospedeira. A variabilidade causada por mutações aleatórias é comum nestes vírus. Assim, o uso do Tamiflu, ainda que acelerando a seleção de resistências, em grande escala, contribuirá na redução da mortalidade sem interferir na aquisição de imunidade de grupo. A seleção de resistência seria lenta a princípio, e ainda em competição com a seleção de estratégistas r. Além disso, a seleção de resistêntes não é um processo automático, e muitas cepas poderão ser lentas ou inadaptadas, portanto inviáveis. A seleção de uma cepa epidemicamente robusta é um processo complexo e imprevisível. Mais adiante, colocarei aqui modelos matemáticos baseados em evidências para ilustrar essa questão. Não há nenhuma justificativa racional para limitar o uso e a distribuição do Tamiflu, portanto.
Notas.
Sobre evolução e genética de populações veja:
Fernando Portela Câmara. Variabilidade e Adaptação: As Bases Genéticas da Evolução, no endereço:
http://www.iced.org.br/artigos.htm
Fernando Portela Câmara. Dinâmica das Epidemias Virais. In: Introdução à Virologia Médica (ed. p. NSO Santos, MTV Romanos e MD Wigg), Rio de Janeiro: Ed. Guanabara Koogan, pp. 510-515, 2008.
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O governo brasileiro monopolizou a distribuição do Tamiflu, condicionando-a a uma desnecessária burocracia para retirar o medicamento dos postos de distribuição, limitando o cidadão na liberdade de escolha e o médico, da relação direta com o paciente mediante uma simples prescrição, sem burocracia intermediadora e protocolos que engessam uma decisão médica e a submete a critérios leigos. O Ministério da Saúde, contudo, em seu protocolo para orientação no tratamento da gripe, publicado em 04/08/2009 no site
http://portal.saude.gov.br/portal/aplicacoes/noticias/default.cfm?pg=dspDetalheNoticia&id_area=124&CO_NOTICIA=10460
justifica esta medida no item 6 dizendo: " 6) O Ministério da Saúde reitera que o uso indiscriminado do remédio pode tornar o vírus mais resistente e abrir caminho para o surgimento de novas cepas, o que traria mais riscos à saúde pública, como vem alertando a Organização Mundial da Saúde."
Ora, temos aqui um problema de dinâmica de populações, uma vez que uma epidemia nada mais é que um desenvolvimento do modelo predador-presa.
Em ecologia moderna, toda dinâmica de populações está ligada à genética de populações, portanto, essa dinâmica é também evolucionária. Define-se hoje evolução como mudança na frequência de genes ao longo das gerações, sendo importante notar que esta mudança não está necessariamente condicionada a seleção natural, como geralmente se pensa, e pode decorrer de outros processos. Como Darwin não conhecia ainda os genes, a seleção natural do melhor adaptado era a única força evolutiva aceitável. O Tamiflu pode selecionar cepas resistentes a este medicamento, mas dizer que isto leva a um cepa mais virulenta é desconhecer totalmente a teoria da evolução, a genética de populações e a genômica viral. Além disso, dinamicamente o uso precoce do Tamiflu pode ser benéfico, reduzindo significativamente a mortalidade sem afetar a aquisição de imunidade de grupo. Vejamos.
A presente pandemia é uma típica "epidemia de população virgem" (entenda-se: população sem nenhuma defesa imunológica prévia para o novo vírus). Na fase inicial, o vírus evolui selecionando-se formas mais adaptadas e de crescimento rápido (estratégia r), espalhando-se rapidamente na população numa primeira onda invasora. Esta seleção de replicantes rápidos está associada a um aumento na virulência à medida que a propagação aumenta. Com isso, cepas mais virulentas são selecionadas e o patógeno garante a transmissão de seus genes. Ao mesmo tempo, a população experimenta mortalidade acima do esperado, sem que isto afete o aumento da proporção de imunes (recuperados da infecção). Esse último fenômeno é conhecido como "imunidade de grupo", e seu aumento reduz a transmissão viral, difcultando-a até extingui-la (após mais duas ou três ondas sazonais, no caso de uma nova linhagem de influenza A).
Quando a população torna-se em sua maior parte imune, cepas mais atenuadas do vírus começam a ser selecionadas. Estas cepas levam mais tempo no hospedeiro (o que aumenta a chance de transmissão na população agora escassa de susceptíveis), persistindo agora nas crianças nascidas depois da pandemia (totalmente susceptíveis) e nos idosos imunologicamente deficitários, caso a proporção destes seja suficiente para sustentar a transmissão (o que exige uma população suficientemente grande). Nesta fase, a seleção muda para a estratégia K. É deste modo que uma cepa pandêmica atenua-se e persiste como cepa "sazonal". Ocasionalmente, os virus da influenza sofrem mutações que origina variantes capazes de iludir o sistema imune das pessoas anteriormente imunizadas pelo virus pandêmico. Isto dá origem a epidemias sazonais de baixa mortalidade.
Na fase inicial da epidemia, a seleção de cepas mais virulentas é uma tendência proporcionada pelo tamanho da população e sua alta proporção de susceptíveis. O Tamiflu nada tem a ver com isso, como é sugerido no site do MS.
Mais cedo ou mais tarde, aparecerão cepas resistentes ao Tamiflu, mesmo que este quimioprofilático não tenha sido usado na população hospedeira. A variabilidade causada por mutações aleatórias é comum nestes vírus. Assim, o uso do Tamiflu, ainda que acelerando a seleção de resistências, em grande escala, contribuirá na redução da mortalidade sem interferir na aquisição de imunidade de grupo. A seleção de resistência seria lenta a princípio, e ainda em competição com a seleção de estratégistas r. Além disso, a seleção de resistêntes não é um processo automático, e muitas cepas poderão ser lentas ou inadaptadas, portanto inviáveis. A seleção de uma cepa epidemicamente robusta é um processo complexo e imprevisível. Mais adiante, colocarei aqui modelos matemáticos baseados em evidências para ilustrar essa questão. Não há nenhuma justificativa racional para limitar o uso e a distribuição do Tamiflu, portanto.
Notas.
Sobre evolução e genética de populações veja:
Fernando Portela Câmara. Variabilidade e Adaptação: As Bases Genéticas da Evolução, no endereço:
http://www.iced.org.br/artigos.htm
Fernando Portela Câmara. Dinâmica das Epidemias Virais. In: Introdução à Virologia Médica (ed. p. NSO Santos, MTV Romanos e MD Wigg), Rio de Janeiro: Ed. Guanabara Koogan, pp. 510-515, 2008.
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Sobre este blog
Este blog não somente dedicado à pesquisa e ensino acadêmicos, ele é também dirigido ao público esclarecido, um espaço para discussões, acadêmicas e extra-acadêmicas, pública e geral. Trato aqui de genes virulentos invasores, seus efeitos nas populações, sociedades e história, sua evolução e origem, enfim, tudo relacionado à rede de informações codificadas em uma variedade de genes que secretamente dirige nosso destino e a evolução no planeta.
F Portela Câmara
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